quinta-feira, 17 de maio de 2012

Capítulo 46 - Elizabeth chega em casa


Capítulo 46 - Elizabeth chega em casa


- Estive reflectindo novamente no caso, Elizabeth - disse o tio, quando já se afastavam da cidade -; e, pensando bem, sinto-me mais inclinado a encarar as coisas como a tua irmã mais velha. Parece-me muito pouco provável que qualquer rapaz possa formar um desígnio desses contra uma rapariga que não é de forma alguma desprotegida nem carece de relações, e que, além disso, se encontrava a residir com a família do coronel do próprio destacamento. Por tudo isto me inclino a acreditar no melhor. Poderia ele supor que os amigos dela não interviriam a seu favor? Poderia ele esperar ser novamente aceite pelo destacamento depois de uma tal afronta ao coronel Forster? O risco seria maior do que a tentação.

- Pensa realmente assim? - exclamou Elizabeth, subitamente esperançada.

- Dou-te a minha palavra de honra que também eu começo a ser da opinião do teu tio - disse a Sr.a Gardiner. - Um tal acto representa tão grande violação da decência, da honra e do bom senso que não considero Wickham capaz de praticá-lo. E tu, Lizzy, será que mudaste tanto a respeito de Wickham que o julgues agora capaz disso?

- Não o julgo capaz de descuidar os seus próprios interesses, mas, quanto ao resto, ponho as minhas dúvidas. Se, ao menos, eu pudesse acreditar no que acabam de me dizer! Mas não ouso esperar. Se tudo isso é verdade, por que não foram eles para a Escócia?

- Em primeiro lugar - replicou o Sr. Gardiner - não temos provas concludentes de que eles não tenham ido para a Escócia.

- Oh!, mas o facto de eles terem tomado uma diligência indica claramente qual a sua intenção; e, além do mais, não encontraram sinais da sua passagem na estrada de Barnett.

- Bom, supondo que eles estejam em Londres; poderão ter ido lá apenas para se esconder. Não é provável que algum deles tenha dinheiro suficiente e é justo que tenham achado mais económico casarem em Londres do que na Escócia.

- Mas, então, porquê todo este mistério? Por que se escondem eles? Por que razão desejam casar secretamente? Oh!, não, isso não é verdade! O mais íntimo amigo de Wickham, como puderam ver pela carta de Jane, está persuadido de que ele nunca teve a intenção de casar com ela. Wickham nunca se casará com uma mulher que não tenha meios de fortuna. Ele não poderá sustentá-la. E que
atractivos possui Lydia, para além da frescura da sua mocidade, para que ele renuncie por sua causa a um casamento rico? Quanto à ofensa aos brios de um regimento que esse atentado contra a honra de uma rapariga possa produzir, não sei até que ponto isso lhe terá trazido qualquer hesitação, assim como também não sei quais as consequências de tal acto. Mas, quanto à sua outra objecção, não creio que ela tenha muito peso. Lydia não tem irmãos que a possam defender; e Wickham, que conhece meu pai, terá julgado que, com a sua indolência e a pouca atenção que ele parece dar à família, ele pouco faria e pensaria o menos possível no assunto.

- Mas pensas tu que Lydia está tão perdidamente apaixonada por ele que consinta em viver com um homem sem serem casados?

- Tudo o indica, e é bem triste - respondeu Elizabeth, com lágrimas nos olhos - ter de pôr em dúvida o senso da decência e da virtude de uma irmã! Mas, realmente, eu não sei o que dizer. Talvez eu esteja sendo injusta; mas Lydia é muito jovem e inexperiente, nunca lhe ensinaram a pensar em coisas sérias. Durante os últimos seis meses, ou, melhor, durante todo o ano, ela não fez mais do que divertir-se e dar largas à sua vaidade. Deram-lhe toda a liberdade para dispor do seu tempo da maneira mais frívola e inútil e de adoptar as opiniões de todos os que encontrava. Desde que o destacamento miliciano foi para Meryton, ela não pensou noutra coisa senão em namorar os oficiais. Ela fez tudo o que estava em seu poder para, pensando ou falando sobre o assunto, dar maior... como direi?... susceptibilidade aos seus sentimentos, já por natureza facilmente inflamáveis. E, como sabemos, a Wickham não lhe faltam qualidades para cativar uma mulher.

- Mas como podes ver - disse-lhe a tia -, Jane não o julga capaz de tal procedimento.

- Mas haverá alguém de quem Jane possa alguma vez pensar mal? E qual a pessoa que ela alguma vez consideraria capaz de tal procedimento, quaisquer que fossem os seus antecedentes, até o facto ter sido confirmado? Mas Jane conhece esse Wickham tão bem como eu. Ambas sabemos que se trata de um dissoluto em todos os sentidos da palavra; que ele não tem integridade nem honra; e que ele é tão falso e perigoso como insinuante.

- E sabes realmente tudo isso? - exclamou a Sr.a Gardiner, curiosa.

- Sim, sei-o - replicou Elizabeth, corando. - Já no outro dia os pus a par da sua infame conduta para com o Sr. Darcy. E a própria tia, quando esteve em Longbourn da última vez, ouviu em que termos ele falou de um homem que se mostrou tão generoso para com ele. Existem ainda outras circunstâncias que não vale a pena mencionar. Mas as mentiras dele a respeito da família de Pemberley são inumeráveis. Pelo que ele me disse da Menina Darcy, julgava ir encontrar nela uma rapariga orgulhosa, fechada e desagradável. No entanto, ele sabia a verdade. Ele deve saber que, pelo contrário, ela é amável e modesta.

- Mas Lydia nada sabe de tudo isto? Será que ela ignora o que tu e Jane parecem compreender tão bem?

- Oh!, sim, e é isso que me amargura! Até ir para o Kent e conhecer mais intimamente tanto o Sr. Darcy como o coronel Fitzwilliam, seu primo, eu própria ignorava toda a verdade. Ao voltar para casa, soube que o destacamento deixaria Meryton dentro de quinze dias, e, visto isso, nem eu nem Jane, a quem contei todo o caso, julgámos necessário tornar pública a nossa descoberta, pois pensámos que a ninguém aproveitaria destruir a boa reputação de que ele gozava na vizinhança. E, mesmo quando ficou decidido que Lydia iria com a Sr.a Forster, nunca me ocorreu a necessidade de abrir os seus olhos quanto ao carácter de Wickham. Não conjecturei, nem por um instante, que ela corresse o risco de ser iludida; e, naturalmente, nem de longe imaginava que pudesse sobrevir tal consequência.

- E, quando partiram todos para Brighton, não tinhas motivos para supor, então, que eles gostassem um do outro?

- Nem sombra deles. Não me lembro do menor sintoma de afeição, tanto de um lado como do outro. E, se algo de semelhante houvesse entre eles, a tia bem sabe que a nossa família não deixaria de dar por isso. Quando ele apareceu, Lydia estava tão disposta a admirá-lo como, aliás, todas as raparigas das redondezas, que durante uns dois meses tiveram a cabeça perdida por ele. Mas Wickham nunca distinguiu Lydia com qualquer atenção particular, e, após um curto período de desvairado entusiasmo, ela voltou de novo a sua atenção para os outros oficiais.

Facilmente se compreenderá que, durante toda a viagem, conquanto nenhum facto novo os viesse esclarecer acerca dos seus temores, esperanças e conjecturas, nenhum outro tópico tenha podido desviá-los por muito tempo daquele interessante assunto. Elizabeth pensava nele continuamente; e a mais aguda de todas as angústias, o remorso, a impedia de encontrar um só minuto de paz.

Viajaram o mais velozmente possível; e, tendo dormido uma noite no caminho, chegaram a Longbourn no dia seguinte, à hora do jantar. Era um consolo para Elizabeth saber que, pelo menos, Jane não teria de esperar muito tempo. Quando a carruagem entrou no jardim e se aproximou da porta de casa, todos os pequenos Gardiners, atraídos pelo rumor, se vieram colocar nos degraus da escada; e, quando o carro finalmente parou, a alegria transpareceu nas suas caritas e fê-los dar pulos e piruetas de contentes.

Elizabeth apeou-se de um salto, e, após ter dado a cada um um rápido beijo, correu para o vestíbulo, onde se encontrou com Jane, que momentos antes se encontrava no quarto da mãe e tinha descido precipitadamente as escadas. Abraçaram-se ternamente e com os olhos marejados de lágrimas. Elizabeth, sem perda de tempo, perguntou-lhe se já sabiam alguma coisa dos fugitivos.

- Ainda não - replicou Jane -, mas agora, que o nosso tio veio, espero que tudo corra melhor.

- O nosso pai está em Londres?

- Está. Foi para lá na terça-feira, conforme te escrevi.

- Já receberam notícias dele?

- Sim, escreveu uma vez. Escreveu-me umas linhas na quarta-feira, dizendo que tinha chegado bem e dando a sua morada, como eu lhe tinha pedido. Acrescentava também que não tornaria a escrever enquanto não tivesse alguma coisa de positivo a comunicar.

- E a mãe, como está ela? Como estão todos?

- A mãe está razoavelmente bem, embora muito deprimida. Ela está lá em cima e terá um prazer imenso em vê-los a todos. Não saiu ainda do quarto. Mary e Kitty, graças a Deus, estão bem.

- E tu, minha querida, como estás? - exclamou Elizabeth.
- Pareces pálida! Que momentos difíceis não terás passado!

Jane, no entanto, era categórica em afirmar que se sentia perfeitamente bem. O diálogo foi interrompido pela entrada do Sr. e da Sr.a Gardiner, que até àquele momento tinham estado com as crianças. Jane correu para os tios e abraçou-os, agradecendo a ambos, entre sorrisos e lágrimas.

Quando entraram para a sala, as perguntas que Elizabeth já tinha feito foram naturalmente repetidas pelos outros; mas logo se inteiraram de que Jane nada tinha de novo para lhes dizer. No entanto, devido ao seu caracter indulgente, Jane não perdera ainda todas as esperanças. Ela ainda acreditava que tudo acabasse em bem e que numa das manhãs próximas chegaria uma carta, de Lydia ou de seu pai, explicando o procedimento dos fugitivos e anunciando, talvez, o seu casamento.

Em seguida, subiram todos ao quarto da Sr.a Bennet, que os recebeu exactamente como era de esperar. Com lágrimas, lamentações, invectivas contra a conduta infame de Wickham e queixas pelos padecimentos que lhe estavam infligindo, ela atirava as culpas para todos, esquecendo-se que fora ela própria, com a sua insensata indulgência, a principal causadora do que acontecera à filha.

- Se me tivessem feito a vontade - dizia ela -, se eu tivesse ido também para Brighton, com toda a família, nada disto teria acontecido. Mas a minha pobre Lydia não tinha ninguém que tomasse conta dela. Por que é que os Forster não olharam mais por ela? Estou certa de que houve um grande descuido da parte deles, pois Lydia nunca faria tal coisa se tivesse alguém a olhar por ela. Sempre pensei que eles nunca serviriam para tomar conta da minha filha. Mas, como sempre, ninguém quis ouvir a minha opinião. Minha pobre filhinha... e o Sr Bennet, lá foi. Sei que ele se vai bater em duelo com Wickham e decerto será morto. Que vai ser de nós, então? Os Collins expulsar-nos-ão daqui antes de o corpo ter tido sequer tempo para esfriar. E, se não fores tu, meu irmão, não sei o que será.

Todos protestaram contra ideias tão sinistras; e o Sr. Gardiner, após tranquilizá-la quanto à afeição que sentia por ela e pela sua família, disse tencionar partir para Londres no dia seguinte, a fim de prestar o auxílio devido ao Sr. Bennet nas suas tentativas para encontrar Lydia.

- Não te entregues a receios exagerados - acrescentou ele. Embora seja acertado uma pessoa preparar-se para o pior, não há motivo para considerá-lo uma certeza. Ainda não há uma semana que saíram de Brighton. Dentro de poucos dias deveremos receber notícias deles; e, até que tenhamos a confirmação absoluta de que não estão casados e de que não têm a intenção de casar, não podemos considerar tudo perdido. Mal chegue a Londres vou ter com o teu marido e levá-lo-ei comigo para a Rua Gracechurch; e aí combinaremos o que deve ser feito.

- Oh, meu querido irmão - replicou a Sr.a Bennet -, é exactamente isso o que eu mais desejo. E, quando chegares a Londres, faz tudo para encontrares a minha filha, onde quer que ela esteja. E, se eles não estiverem casados, faz que se casem. Quanto ao enxoval, diz-lhes que não precisam de esperar. Diz a Lydia que ela terá todo o dinheiro que quiser para o comprar depois de se casar. E, sobretudo, não deixes o Sr. Bennet brigar com o Sr. Wickham. Conta-lhe em que estado me vieste encontrar, que estou terrivelmente assustada, e tenho tremores por todo o corpo, horríveis dores no ado, na cabeça e tantas palpitações que não posso descansar nem de dia nem de noite. E diz à minha querida Lydia que nada decida sobre as roupas até ter falado comigo, pois ela não conhece as melhores lojas. Oh!, meu querido irmão, que bom que és! Estou certa de que arranjarás tudo!

O Sr. Gardiner, embora lhe assegurasse que faria todos os esforços possíveis, não pôde deixar de lhe recomendar moderação, tanto nas suas esperanças como nos seus receios; e após terem-na reconfortado até à hora do jantar, deixaram-na entregue aos cuidados da governanta, que a servia na ausência das filhas.

Embora o Sr. e a Sr.a Gardiner estivessem persuadidos de que não havia motivo para tal reclusão, preferiram não se opor, pois sabiam que ela não tinha prudência suficiente para se abster de proferir algo diante dos criados. Era preferível, portanto, que a governanta apenas, aquela em quem mais confiavam, ficasse sabendo de todas as suas mágoas e temores.

Na sala de jantar, Mary e Kitty, que até àquele momento se tinham conservado nos seus respectivos quartos e não haviam ainda aparecido, juntaram-se finalmente ao resto da família. Uma vinha dos seus livros e a outra do toucador. Os seus rostos, no entanto, aparentavam grande calma. Apenas Kitty se mostrava mais quezilenta do que o costume, mas não se percebia se seria por causa da perda da irmã ou da raiva que sentia por se ver envolvida no acontecimento. Quanto a Mary, o domínio sobre si mesma era perfeito; e, com uma expressão muito séria, sussurrou a Elizabeth, pouco depois de se sentar à mesa:

- É um acontecimento deveras desagradável; e provavelmente será muito comentado. Mas nós devemo-nos opor à maré da maledicência e derramar sobre os nossos corações feridos o bálsamo do consolo fraternal.

Em seguida, vendo que Elizabeth não estava disposta a responder, acrescentou:

- Por mais infeliz que Lydia possa vir a ser, poderemos de tudo isto extrair uma útil lição: que a perda da virtude numa mulher é irreversível; que um só passo em falso acarreta uma série de desgraças sem fim; que a sua reputação não é menos frágil que a sua beleza; e que uma mulher nunca será cautelosa demais para com as pessoas do sexo oposto, especialmente para com aquelas que não merecem a sua confiança.

Elizabeth ergueu os olhos, atónita, mas sentia-se oprimida de mais para responder. Mary, contudo, continuou consolando-se, extraindo máximas morais da infelicidade de sua irmã.

Durante a tarde, as duas mais velhas lograram ficar meia hora sozinhas; e Elizabeth imediatamente aproveitou a oportunidade para pedir a Jane que lhe contasse todos os pormenores do sucedido. Jane estava igualmente ansiosa por conversar com a irmã sobre o assunto. Começaram por lamentar as terríveis consequências daquele facto, consequências essas que Elizabeth considerava extremamente graves. Jane não podia afirmar que os prognósticos de sua irmã fossem de todo impossíveis. Em seguida, Elizabeth prosseguiu no assunto, dizendo:

- Conta-me tudo o que ainda não sei. Dá-me outros detalhes. Que diz o coronel Forster? Desconfiaram alguma coisa antes da fuga, decerto. Tê-los-ão visto os dois frequentemente juntos.

- O coronel Forster, de facto, confessou que muitas vezes desconfiara de que havia algo, especialmente da parte de Lydia, mas que nunca nada se passou que lhe inspirasse alarme. Tenho muita pena dele. Mostrou-se extremamente bom e atencioso. Desde logo resolveu vir até cá para nos comunicar as suas preocupações, mesmo antes de saber que eles não tinham ido para a Escócia. Os rumores que começaram a circular apressaram a sua partida.

- E Denny estava convencido de que Wickham não pretendia casar? Sabia que eles planejavam fugir? O coronel Forster falou com Denny pessoalmente?

- Falou; mas, ao ser interrogado pelo coronel, Denny negou saber qualquer coisa a respeito do plano deles. Não quis dar a sua verdadeira opinião e não tornou a repetir que estava convencido de que eles não se casariam. Por tudo isto, alimento uma certa esperança de que ele não tenha medido as palavras que anteriormente proferira.

- E, até o coronel Forster chegar, nenhuma de vocês suspeitou que eles não tivessem realmente casados?

- Como é que tal ideia nos poderia passar pela cabeça? Eu senti-me um pouco temerosa quanto à felicidade de minha irmã com aquele casamento, pois sabia que o comportamento dele nem sempre fora dos melhores. O pai e a mãe nada sabiam a respeito dos antecedentes do rapaz e sentiam apenas que aquele casamento era imprudente. Kitty então confessou, triunfante, que sabia mais do que nós, pois Lydia, na sua última carta, deixara entrever as suas intenções. Deu a entender que há muitas semanas que ela já sabia que os dois estavam apaixonados.

- Mas sabia disso antes de eles partirem para Brighton?

- Não, creio que não.

- E o coronel Forster mostrou que desconfiava de Wickham? Ele conhece o seu verdadeiro carácter?

- Devo confessar que ele não falou tão bem de Wickham como anteriormente o fizera. Disse que o considerava imprudente e extravagante. E, desde que este infeliz acontecimento teve lugar, soube-se que ele saiu de Meryton muito endividado; mas espero que isto seja falso.

- Oh, Jane, se nós não tivéssemos sido tão discretas, se tivéssemos dito o que sabíamos a respeito dele, nada disto teria acontecido!

- Talvez tivesse sido melhor - replicou Jane -, mas não me parecia justo denunciar os erros passados de uma pessoa sem saber quais os seus sentimentos naquele momento. Agimos com a melhor das intenções.

- E o coronel Forster sabia os termos da carta de Lydia para sua mulher?

- Ele trouxe-a consigo.

Jane tirou então a carta do bolso e estendeu-a a Elizabeth. O seu conteúdo era o seguinte:

Minha querida Harriet:

Rirás quando souberes que fugi, e eu não posso deixar de rir também ao pensar na tua surpresa quando amanhã de manhã deres pela minha falta. Vou para Gretna Green; e, se
não adivinhas com quem, és uma tola. Só existe um homem no mundo que eu amo, e ele é um anjo. Nunca poderia ser feliz sem ele, por isso não vejo mal em partir. Escusas de escrever para Longbourn a comunicar a minha partida, se não te apetecer, pois isso tornará apenas maior a surpresa quando eu própria lhes escrever e assinar o meu nome: Lydia Wickham. Há-de ser uma boa piada. Quase não consigo escrever, de tanto rir. Transmite as minhas desculpas a Pratt por não poder cumprir a minha palavra e dançar com ele hoje à noite. Diz-lhe que espero que ele me perdoe quando souber o motivo e que terei o maior prazer em dançar com ele no próximo baile em que nos encontrarmos. Mandarei buscar as minhas roupas quando chegar a Longbourn; mas gostaria que dissesses à Sally para coser o enorme rasgão do meu vestido de mousseline, antes de guardar tudo na mala. Até breve. Cumprimentos ao coronel Forster. Espero que bebam à nossa saúde, desejando-nos uma boa viagem. Tua amiga afectuosa, Lydia Bennet.

- Oh! Que cabeça oca a tua, Lydia! - exclamou Elizabeth, depois de ler a carta. - Escrever uma carta destas num tal momento! Pelo menos, mostra que as suas intenções eram sérias. Não sei se ele depois a persuadiu a fazer outra coisa, mas, pelo menos da parte dela, a infâmia não foi premeditada. Pobre pai, como ele não deve ter sofrido!

- Nunca vi ninguém tão abalado. Durante dez minutos não conseguiu dizer palavra. A mãe adoeceu imediatamente e toda a casa ficou em alvoroço e confusão!

- Oh, Jane - exclamou Elizabeth -, terá havido algum criado nesta casa que, ate ao fim do dia, não ficasse ao par de toda a história?

- Não sei, mas espero que sim. Mas numa ocasião destas é muito difícil ser-se discreta. A nossa mãe ficou histérica; e, embora eu procurasse auxiliá-la da melhor forma, creio que não fiz tanto quanto devia ter feito! Mas o horror do que poderia acontecer quase me privou do uso das minhas faculdades.

- Os teus cuidados para com ela exigiram muito de ti. Não te encontro tão bem de saúde. Gostaria de ter estado a teu lado. Tiveste de suportar tudo sozinha.

- Mary e Kitty mostraram-se muito prestáveis, e estou certa de que fariam o possível por me ajudar, mas achei que não convinha a nenhuma delas. Kitty é muito sensível e Mary estuda tanto que as suas horas de repouso não devem ser interrompidas. A tia Philips apareceu cá na terça-feira, após a partida do pai, e teve a bondade de ficar até quinta comigo. O seu auxílio foi-nos precioso. Lady Lucas também tem sido muito delicada. Veio até aqui, pelos seus próprios meios, na quarta-feira de manhã, para nos acompanhar na nossa mágoa e oferecer os seus serviços e os de qualquer uma das suas filhas, caso necessitássemos.

- Seria melhor que ela tivesse ficado em casa - exclamou Elizabeth -, talvez a intenção fosse boa, mas numa situação como esta deve-se procurar os vizinhos o menos possível. Qualquer auxílio é impossível. As condolências são insuportáveis. Que elas triunfem sobre nós à distância e se dêem por satisfeitas.

Elizabeth quis saber, então, quais os planos do pai para a recuperação de Lydia.

- Creio que ele tencionava ir a Epsom, local onde os fugitivos mudaram de cavalos pela última vez, para falar com os postilhões e ver se poderia obter deles qualquer informação. O seu principal objectivo era descobrir o número da diligência tomada por eles e que os trouxe de Clapham. Ela acabara de chegar de Londres e é possível que alguém tenha reparado neles, pelo menos o passageiro que lá vinha e que foi depositado antes de os outros subirem. Ele ia tentar descobrir esse passageiro e saber qual o posto e o número do coche. Não sei se o pai tem outros projectos em mente. Ele estava com tanta pressa em partir, tão inquieto e deprimido, que foi com grande dificuldade que lhe consegui extrair o que acabo de te dizer.


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